Sou um fã das palavras.
Na infância tinha um dicionário de sinônimos que folheava sempre antes de ir para a escola e escolhia, dentre aquelas várias expressões pouco conhecidas, as que seriam usadas naquele dia. Os sinônimos de bagunça eram investimento certo. Sempre tinha uma oportunidade de usá-los. "Olha a algazarra!" gritava eu no meio da maior fuzarca durante as aulas de Português ganhando pontos com o professor. Uma pena as inúmeras letras da Química ou os caracteres gregos da Física não formarem palavras, pois precisaria mais dos pontos nessas disciplinas.
Esse hábito me acompanha desde então, mas não sou daqueles que pretendem aprender uma palavra nova por dia. No entanto, às vezes invento uma história, um poema ou um verso só para dar asas a uma palavra grudenta que não me sai da cabeça. Se procurarem bem, acharão a palavra "esquife" ou a expressão "para lá e para cá" com certa frequência em alguns períodos por aqui pelo blog. Outras vezes, construo textos só para que uma certa palavra brilhe. Vou polindo as bordas, afiando as pontas, abalroando os engastes até encaixá-la perfeita, translúcida na idéia central.
Por causa desse gosto pelas palavras acabo também gostando de pessoas que inventam palavras. Não raro são indóceis, inconformados, inteligentes e visionários. Não é qualquer um que inventa uma palavra. É preciso coragem e ousadia para expor-se ao ridículo de uma ignorante correção. Digo ignorante não no sentido de falta de conhecimento, o que seria um contra-senso, mas pela falta de educação que é tentar matar a língua que é viva e enjaular a criatividade que voa. Enfim, ignorantes aqueles que não entendem e sufocam um neologismo. Mesmo que já exista um termo etimologicamente correto para uso. Diga ao Menino Maluquinho que "mexedorzinho" é colher e eu digo que és um mequetrefe.
Em sua ansiedade, a pessoa que inventa palavras quer apenas traduzir o que sente, dar forma às ininteligíveis matizes de sua alma. Fazer-se entender, pura e simplesmente. Admiro isso e gostaria de ter esse dom, pois aliviaria, e muito, a minha própria ansiedade.
Mas mesmo sendo o ardoroso fã que sou das palavras, não posso deixar de reconhecer nelas uma falha ou, amenizando, afinal, como fã tenho esse direito, uma limitação. E uma óbvia limitação.
Tente descrever o pôr-do-sol na praia num dia de verão. Já tentei, AQUI, é impossível. Ou a figura de uma noiva sendo abandonada no altar. Também tentei, improvável que alguém adivinhe. Um dia eu incluo nesse blog.
Mas muito pior que descrever situações, é descrever os sentimentos. Tente descrever o que sente quando aquela pessoa mais do que querida passa por você. Difícil. Agora tente traduzir a diferença de quando essa pessoa passa e quando ela passa e realmente olha para você. É sutil e ao mesmo tempo mais complexo. Tem palavra suficiente para isso? E quando suas mãos se tocam sem querer ou aquela troca de olhares antes do primeiro beijo. Como explicar a tremedeira, o suadouro, a garganta seca que são os efeitos físicos dessas situações? Como entender a tremedeira sendo borboletas no estômago, o suadouro sendo humores do amor e a garganta seca, a sede da paixão. Ah, ingênuos poetas, achando que se fazem entender.
A triste conclusão é a de que, por mais palavras que se inventem, nunca conseguiremos traduzir fielmente o que sentimos. A comunicação será sempre limitada e a necessidade por novas palavras sempre infinita. Para um fã de palavras, é um cenário e tanto, mas não troco aquele olhar, aquele toque e aquele beijo nem por mil palavras.
Nenhum comentário:
Postar um comentário