o sol queima doloroso
como um tição a marcar o dorso
da rés que rumina o verde pasto
e não somos todos reses
nesse mundo vil e vasto?
a noite traz com a lua fria
a palavra de uma promessa vazia
cravando no peito a verdade absoluta
é da natureza das coisas
que o vinho se transforme em cicuta?
essa marcha incessante
a passos firmes para um horizonte
que nos conclama à felicidade
sob uma chuva de insatisfações
será ilusão essa nossa verdade?
paro, fecho o guarda-chuva
e me molho e sob a visão turva
me vejo fundido à pastosa vida
entrelaçado por rancores,
buscando amores sob o pus das feridas
no chão, água e sangue são um só
enquanto me desfaço no pó
das cinzas de alguém que um dia fui
é da natureza das coisas
que seja o pó o mal do mundo, se conclui
e é dessa mistura louca
de sangue, pó e outra coisa pouca
que um dia fomos nós moldados
mas é da natureza das coisas
que todos os erros sejam reparados
o tanto mal que ainda nos resta
e que escorre de nós por cada fresta
levará séculos a ser redimido
pois é da natureza do tempo
fazer com que os desvios sejam corrigidos
o sol imortal então nos dará a certeza
pois é da sua natureza: o fogo tudo renova
queima até que diminua
o mal que se esconde, sorrateiro, no lado escuro de nós
no lado escuro da lua