Neste post vamos falas sobre William Faulkner (1897 - 1962). Confesso uma ponta de orgulho para tratar desse autor de máxima envergadura literária, um dos pontos mais brilhantes da constelação de estrelas que paira sobre o Império das Letras.
Comecemos pelo óbvio. Faulkner ganhou um Nobel de Literatura (1949), dois Pulitzer de Ficção (1955 e 1962) e dois National Book Awards (1951 e 1955). Com essas credenciais e já estabelecido como grande escritor, foi entrevistado em 1956 pela revista Paris Review sobre sua rotina na literatura, como concebia seus romances e personagens e o que poderia dizer a novos escritores.
Faulkner era um sujeito tímido e introspectivo oriundo do Sul dos Estados Unidos e que preferia a companhia dos simples `a das rodas de literatos que um dia começou a frequentar. Se dizia um poeta fracassado, o que levou-o a escrever romances. Sua obra, apesar de muito elogiada pela critica, não teve tanto sucesso com o publico geral. No entanto, nunca deu importância `a critica.
A unica responsabilidade de um escritor é com a sua própria arte. O artista não tem tempo para dar ouvidos aos críticos. os que desejam ser escritores leem os críticos, os que querem escrever não os leem. O artista esta um furo acima do critico, pois o artista esta escrevendo algo que fara o critico funcionar. O critico esta escrevendo algo que afetara todo mundo, menos o artista.
Segundo o autor, a energia de um escritor deveria ser completamente direcionada `a escrita, levando a pratica `a perfeição. Não raro reescrevia completamente seus livros depois de escritos, levava-se ao extremo da técnica, sempre sabendo que poderia escrever melhor do que já havia escrito, tentando achar seu limite. Reescreveu seu grande romance Som e Fúria (1929) cinco vezes, cada uma abordando o olhar de um personagem sobre a mesma historia. O autor diz ter chegado `a versão definitiva apenas apos o livro já ter sido publicado.
Sobre seu processo de criação, dizia "O trovejar e a musica da prosa se processam no silencio. E dava especial atenção a sua técnica, afirmando que "Não havia atalhos". Procurava criar personagens verossímeis em situaçoes tocantes e criveis, da maneira mais viva que fosse possível. Ao escritor, afirmava que deveria possuir três coisas: Experiência, Observação e Imaginação. Mas que possuindo duas dessas características, ou as vezes apenas uma, poderia suprir a falta das demais.
Para ele, a maior qualidade que um artista deve possuir é a objetividade para julgar o seu trabalho, alem da honestidade e da coragem de não enganar a si próprio a respeito dele. Para Faulkner, escrever era tao importante e necessitava de tanta dedicação quanto qualquer outra profissão, seja de cirurgião ou pedreiro e dizia julgar seus trabalhos baseados na angustia e sofrimento que o causaram, já que nenhum deles atingiu os padrões que ele mesmo havia estabelecido.
Um tanto quanto perfeccionista, Faulkner teve como grande incentivador Sherwood Anderson e escreveu utilizando a técnica de fluxo de consciência, inaugurada por Proust e utilizada também por James Joyce e Ezra Pound. Posteriormente essa técnica foi levada `a poesia pela Geração Beatnik de Allen Ginsberg e Jack Kerouak. Dizia não sair de casa sem uma copia de Shakespeare num bolso e do Velho Testamento noutro e dizia não ler os seus contemporâneos, mas Charles Dickens, Flaubert, Balzac, Cervantes, os russos Dostoiévski e Tolstói, e, claro, Shakespeare. Este ultimo considerado a grande referencia, cuja obra superou seu próprio nome.
Se eu não tivesse existido, algum outro teria escrito meus livros: Hemingway, Dostoiévski, todos nos. A prova disso é que ha cerca de três candidatos para a autoria das pecas de Shakespeare. Mas o que é importante é Hamlet e Sonho de Uma Noite de Verão: não quem escreveu, mas o fato de alguém o ter feito. O artista não tem importância. Só é importante o que ele cria, já que não existe nada de novo para ser dito. Shakespeare, Homero, Balzac, todos escreveram acerca das mesmas coisas e, se eles tivessem vivido mil ou dois mil anos, os editores não teriam, desde então, necessidade de mais ninguém.
Afirmava que não apenas cada livro deveria ter um propósito, mas que toda a soma do trabalho de um artista também deveria tê-lo. E, para finalizar, William Faulkner nos brinda com seu conselho aos aspirantes a escritores.
Sempre sonhe e aspire a mais do que aquilo que sabe que pode fazer. Procure sempre ser melhor do que você mesmo; não se preocupe com seus contemporâneos ou seus antecessores. (...) O que eu escrevo tem que agradar-me. Se não me agrada, falar sobre isso não o melhorara em nada. A unica coisa que fara melhorar o que escrevo é trabalhar ele um pouco mais. Não sou literato, sou apenas escritor.
A obra de Faulkner muitas vezes foi adaptada para o cinema e, recentemente, seu grande livro Som e Fúria (1929) foi adaptado pelo ator e diretor James Franco. Para conhecer mais a obra do autor, seguem abaixo algumas referências.
Toda a Saga Yoknapatawpha:
- Sartoris (1929) - http://amzn.to/2ojjLpf
- Som e Fúria (1929) - http://amzn.to/2HF1RFF
- Absalão, Absalão (1936) - http://amzn.to/2HD3sM7
- Os Invictos (1938) - http://amzn.to/2EJUC1c
- Desça, Moises (1942) - http://amzn.to/2EWChxg
- Requiem para uma Freira (1951) - inédito no Brasil
E a Trilogia Snopes
- O Povoado (1940) - http://amzn.to/2ojAbOz
- A Cidade (1957) - http://amzn.to/2Fo6GT5
- A Mansão (1959) - http://amzn.to/2FmwGy1
O que lês quando não és forçado determina o que serás quando não tiveres escolha. - Oscar Wilde.
22 de fevereiro de 2018
19 de fevereiro de 2018
Os 4 estágios da escrita
Se existiu alguém que conviveu de perto com grandes escritores, seu nome é Malcolm Cowley. Ele foi editor da renomada Paris Review e coordenador de diversas edições com entrevistas e conversas com escritores do calibre de Hemingway, Faulkner, Ezra Pound e muitos outros.
Decantando todas as metodologias que levantara desse convívio, nosso amigo Cowley nos presenteou com esse resumo que ele chamou de 4 Estágios da Escrita. Vamos a eles:
1 - CONCEPÇÃO: O gérmen da história nasce de um flash, um momento a primeira vista sem importância que, de alguma forma, se instala no subconsciente. No momento em que reconhecemos esse flash, temos a sensação de que poderíamos escrever uma história sobre ele. Um momento fugaz, uma singeleza que nos capta atenção e se encasula em nossa mente.
2 - INCUBAÇÃO: É o tempo do qual aquele flash precisa para se desenvolver, tempo de meditar sobre ele mesmo inconscientemente, um período gestatório em que nos distanciamos e voltamos ao tema durante outra atividades corriqueiras. Durante esse período, o escritor se pergunta quais as características dos personagens, como abordar o inicio da historia, como chegar ao seu clímax, como desenhar seu desfecho. É um processo ao mesmo tempo consciente e inconsciente como se um grito das profundezas do sono pudesse ter seu eco ouvido e revisto durante a vigília.
3 - PRIMEIRO RASCUNHO: A primeira versão da história geralmente é escrita em alta velocidade, é o melhor jeito de escreve-la. Nesse momento não importa a forma, a grafia, a pontuação, tudo sai de forma espontânea, qualquer coisa vale! Alguns autores tem métodos mais sofisticados, conseguem uma versão quase completa já no primeiro rascunho, mas usualmente, o primeiro texto é um diamante bruto.
4 - REVISÃO, REVISÃO, REVISÃO: Se há um consenso entre todos os escritores é sobre a importância da revisão. Alguns gastam pouco tempo, outros continuam revisando e escrevendo mesmo depois de o livro ser impresso. O trabalho de burilamento do texto é importante para celebrar a função de cada palavra e cada frase, ter certeza de que estão posicionadas de forma a gerar o resultado que o autor deseja.
E então? Preparado para colocar no papel suas inspirações?
Não esqueça de compartilhar conosco. Esperamos ansiosos sua contribuição!
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2 de fevereiro de 2018
François Mauriac e o êxito em ser escritor
François Mauriac foi escritor, cronista, jornalista e poeta francês premiado com o Nobel de Literatura em 1952. Segundo Otto Maria Carpeaux "o maior representante do romance psicológico da tradição francesa". Segundo o próprio Mauriac: "um metafisico que trabalha com o concreto".
Escreveu dez romances entre 1920 e 1932, entre os mais celebres estão Le Baiser au Lepreux (1922), Genitrix (1923), Therese Desqueyroux (1927) e Le Noed de Viperes (1952) e também sobre as vidas de Racine (1928) e Jesus (1936).
Mauriac foi entrevistado para a revista The Paris Review onde compartilhou um pouco de sua técnica e sugestões para escrever romances e outras obras. Sua maior contribuição foi em relação a técnica, a qual legava a cada escritor a aventura de descobrir ou inventar a sua própria, e disse:
"Todo romancista deve inventar sua própria técnica (...). Cada romance digno de tal nome é como outro planeta, que seja grande ou pequeno, com suas próprias leis, assim como possui suam flora e sua fauna. Assim, a técnica de Faulkner é certamente melhor para pintar o mundo de Faulkner, sendo que o pesadelo de Kafka criou seus próprios mitos, que o tornam comunicável."
Assim, trata-se de o escritor criar ou descrever um universo próprio onde a ação de seu romance transcorre, seja ele próximo ou não da realidade como a conhecemos. O importante seria criar um estilo próprio, uma forma individual para contar a sua história, pois só o escritor pode saber o que e como tudo acontece, por isso recai sobre ele a responsabilidade de criar, executar e destruir conforme a história a ser contada.
Como criador deste universo que existe em cada romance, a tentação de interferir diretamente nos destinos dos personagens é constante. Porém, o desenrolar natural da história deve ser considerado para dar-lhe certa legitimidade com a realidade, pelo menos o que se considera real no universo criado pelo autor. Mauriac escrevia espontaneamente ou, segundo ele "com completa naiveté" - deixando-se livre de qualquer ideia pré-concebida do que se pode ou não fazer.
"Quando começo a escrever não me detenho a refletir se estou interferindo demais diretamente na historia, se sei demais a respeito de meus personagens e se deveria ou não julga-los.(...) Em geral, quando começo a escrever, nem todos os pontos importantes do enredo estão estabelecidos."
Mauriac aponta que experiencia de vida é fundamental para a escrita de qualidade. Observar os acontecimentos da própria vida com certa distancia faz com que o escritor tenha bagagem para utilizar em seus textos e dar a eles mais veracidade e credibilidade. De muitas formas, o autor é em parte o personagem, seja o protagonista ou o vilão, até mesmo um secundário que leva uma característica peculiar. Os ambientes, tendem a ser ambientes já conhecidos, consolidados na memoria. Essas "lembranças do passado" como se refere o autor, dão profundidade ao texto e levam o leitor a viver junto com o autor os sentimentos descritos. Por isso, Mauriac diz que o autor jovem, exceto poucas exceções, "quase não tem possibilidades de escrever com exito a cerca de qualquer outro período de sua vida a não ser sua infância e adolescência". Mas termina, do alto de sua experiência e gloria dizendo que todos os seus romances "tem lugar no período de minha adolescência e juventude, são `lembranças de coisas passadas".
Sobre a escrita em si, Mauriac nos urge a sermos nos mesmos e nos darmos com afinco a nossa obra a ponto de tornar as demais e anteriores obsoletas, desnecessárias.
"O primeiro dever de um escritor é ser ele próprio. O esforço de auto-expressão deveria afetar sua maneira de expressão. Jamais comecei um romance sem que esperasse que ele tornaria todos os outros desnecessários. Minha obra-prima saria sempre o romance que estou trabalhando agora".
Isso levaria ao grande êxito do escritor e a coisa mais rara na literatura: "quando o autor desaparece e sua obra permanece."
Mauriac em sua prosa refinada, nos deixou grandes lições e romances.
E para nosso deleite, uma das poucas obras traduzidas para o português do autor para que nunca esqueçamos de seu esforço tão bem recompensado.
O Deserto do Amor - http://amzn.to/2GGP44Z
Escreveu dez romances entre 1920 e 1932, entre os mais celebres estão Le Baiser au Lepreux (1922), Genitrix (1923), Therese Desqueyroux (1927) e Le Noed de Viperes (1952) e também sobre as vidas de Racine (1928) e Jesus (1936).
Mauriac foi entrevistado para a revista The Paris Review onde compartilhou um pouco de sua técnica e sugestões para escrever romances e outras obras. Sua maior contribuição foi em relação a técnica, a qual legava a cada escritor a aventura de descobrir ou inventar a sua própria, e disse:
"Todo romancista deve inventar sua própria técnica (...). Cada romance digno de tal nome é como outro planeta, que seja grande ou pequeno, com suas próprias leis, assim como possui suam flora e sua fauna. Assim, a técnica de Faulkner é certamente melhor para pintar o mundo de Faulkner, sendo que o pesadelo de Kafka criou seus próprios mitos, que o tornam comunicável."
Assim, trata-se de o escritor criar ou descrever um universo próprio onde a ação de seu romance transcorre, seja ele próximo ou não da realidade como a conhecemos. O importante seria criar um estilo próprio, uma forma individual para contar a sua história, pois só o escritor pode saber o que e como tudo acontece, por isso recai sobre ele a responsabilidade de criar, executar e destruir conforme a história a ser contada.
Como criador deste universo que existe em cada romance, a tentação de interferir diretamente nos destinos dos personagens é constante. Porém, o desenrolar natural da história deve ser considerado para dar-lhe certa legitimidade com a realidade, pelo menos o que se considera real no universo criado pelo autor. Mauriac escrevia espontaneamente ou, segundo ele "com completa naiveté" - deixando-se livre de qualquer ideia pré-concebida do que se pode ou não fazer.
"Quando começo a escrever não me detenho a refletir se estou interferindo demais diretamente na historia, se sei demais a respeito de meus personagens e se deveria ou não julga-los.(...) Em geral, quando começo a escrever, nem todos os pontos importantes do enredo estão estabelecidos."
Mauriac aponta que experiencia de vida é fundamental para a escrita de qualidade. Observar os acontecimentos da própria vida com certa distancia faz com que o escritor tenha bagagem para utilizar em seus textos e dar a eles mais veracidade e credibilidade. De muitas formas, o autor é em parte o personagem, seja o protagonista ou o vilão, até mesmo um secundário que leva uma característica peculiar. Os ambientes, tendem a ser ambientes já conhecidos, consolidados na memoria. Essas "lembranças do passado" como se refere o autor, dão profundidade ao texto e levam o leitor a viver junto com o autor os sentimentos descritos. Por isso, Mauriac diz que o autor jovem, exceto poucas exceções, "quase não tem possibilidades de escrever com exito a cerca de qualquer outro período de sua vida a não ser sua infância e adolescência". Mas termina, do alto de sua experiência e gloria dizendo que todos os seus romances "tem lugar no período de minha adolescência e juventude, são `lembranças de coisas passadas".
Sobre a escrita em si, Mauriac nos urge a sermos nos mesmos e nos darmos com afinco a nossa obra a ponto de tornar as demais e anteriores obsoletas, desnecessárias.
"O primeiro dever de um escritor é ser ele próprio. O esforço de auto-expressão deveria afetar sua maneira de expressão. Jamais comecei um romance sem que esperasse que ele tornaria todos os outros desnecessários. Minha obra-prima saria sempre o romance que estou trabalhando agora".
Isso levaria ao grande êxito do escritor e a coisa mais rara na literatura: "quando o autor desaparece e sua obra permanece."
Mauriac em sua prosa refinada, nos deixou grandes lições e romances.
E para nosso deleite, uma das poucas obras traduzidas para o português do autor para que nunca esqueçamos de seu esforço tão bem recompensado.
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