5 de novembro de 2010

Comendo, rezando e amando o Capitão Nascimento

Nesse feriado aproveitei para colocar em dia minhas responsabilidades cívicas, aquelas que todos temos que cumprir mesmo sem querer. Então, fiz duas coisas: votei e fui ver os filmes mais comentados do momento – Tropa de Elite 2 e Comer, Rezar e Amar.


Peguei uma seção dupla: mais cedo me alistei no BOPE e fui com o agora Tenente Coronel Nascimento atrás do novo inimigo. Ainda com sangue na lapela e com a vista cheia de realidade, jantei um belo arroz de polvo e depois me deixei levar pelos devaneios yuppies da bem sucedida em crise existencial Liz Gilbert. No fim, não resisti à tentação de imaginar o que aconteceria se os dois protagonistas se conhecessem.

Se a viagem da escritora ao exterior motivada por sua busca interior a trouxesse ao Brasil, poderia, gastando menos dólares ter aprendido tudo que aprendeu em um ano de gastança rodando o mundo. Na Bahia, aprenderia um novo idioma, o baiano, se empanturrando de iguarias tão ou mais calóricas que os diversos macarrões italianos. Poderia aprender a humildade sem lavar o chão dos templos hindus, mas pescando com lanças nua em pêlo nas comunidades indígenas no interior no Pará, seria uma bela cena. E, finalmente, encontrar seu guru no Rio de Janeiro – o Tenente Coronel Nascimento – no cubículo mais alto, do prédio mais alto do comando mais alto da inteligência policial carioca.

Obviamente o Coronel Nascimento não tem o charme desdentado do guru original, mas também tem a mesma rude sabedoria cujos preceitos básicos provavelmente levariam Liz às mesmas conclusões sem precisar de tanto tempo e num único lugar.

Seria ele a fazer com que ela superasse a propensão imperialista de todo americano e trocaria o peru da ceia de Ação de Graças pelas delícias de um churrasquinho de esquina em Padre Miguel sob fios de alta tensão apinhados de pombos com as mais poéticas misantropias. Lá se apaixonaria pela malemolência brejeira dos operários do pagode, não sem antes descobrir, em Mesquita, o porquê de a Chatuba ser o bonde dos careca (sic).

Seria ele a aproximá-la da fé mostrando que a entediante meditação poderia ser substituída pela pragmática seção de descarrego no templo maior em Del Castilho onde descobriria que o voto de verborragia tem mais poder sobre os ignorantes que o voto de silêncio e que num auditório com duas mil cadeiras poderiam ser encontrados mais de dois mil encostos.

Seria ele próprio, o Coronel Nascimento, a apresentar à moça o amor. Não esse amor hollywoodiano da qual ela fugiu por descobri-lo vazio, mas um amor com a singeleza do Méier, que a fará sonhar em ser apresentadora de telejornal. Um amor tijucano que se cultiva nas efervescentes beiras de piscina dos clubes e nas reluzentes praças de alimentação dos shoppings. E pegariam juntos o 607 chacoalhando até o ponto final, onde se matariam de amor no escurinho aconchegante do Largo do Estácio.

E, no final, ela encontraria no discurso dele logo após o incidente entre o Capitão Matias e o Beirada durante a ocupação de Bangu 1, aquelas palavras que a traduzirão por completo: você tem que aproveitar as chances que tem, mas lembrando que tem coisas que fazem um furo pequeno na entrada, mas o buraco de saída é do tamanho de uma tangerina.

Um comentário:

Dri disse...

Não sei a razão, mas tenho uma nítida impressão de que a autora foi bastante sábia em evitar que Julia Roberts descobrisse "o bonde dos Careca"....rs....
Também não sei se o filme teria uma estética interessante se Julia Roberts passeasse pelo Méier e fosse namorar no Largo do Estácio.
De qualquer forma, é importante mencionar que o Wagner Moura seria um representante do Brasil bem melhor do Javier Barden!!